Produtos e serviços disruptivos são lançados em um ritmo cada vez maior; por isso, é muito importante que as empresas não percam oportunidades de adaptação. As grandes corporações normalmente contam com recursos financeiros, know-how tecnológico, líderes e pessoas talentosas. No entanto, para explorar com eficiência as oportunidades trazidas pelas transformações, é preciso ter também uma boa visão de quais são as competências e deficiências da empresa. A partir daí, é possível entender quais tipos de mudanças a organização é capaz de administrar para alcançar a inovação disruptiva.
Ao perguntar que tipo de inovação as empresas são, ou não, capazes de implementar com sucesso, é fundamental olhar para três fatores: recursos, processos e valores.
- Recursos: são os aspectos que os gestores identificam mais instintivamente ao avaliar se suas organizações podem implementar com sucesso as mudanças que os confrontam. Incluem pessoas, equipamentos, tecnologia, conhecimento, relação com stakeholders, etc. No entanto, uma simples análise de recursos não é suficiente.
- Processos: definem o segundo fator que afeta a capacidade de uma empresa. Eles são criados para que as pessoas executem tarefas de forma consciente no dia-a-dia e não se espera que sejam mudados com frequência. Quando os processos são aplicados na execução das tarefas para as quais foram projetados, é provável que eles sejam praticados de maneira eficiente. Mas quando o mesmo processo aparentemente eficiente é empregado para lidar com uma tarefa muito diferente, é provável que se mostre lento, burocrático e ineficiente. Um processo que cria a competência para executar uma tarefa também pode definir sua própria ineficiência para executar outras.
- Valores: são os critérios pelos quais os profissionais tomam decisões sobre as prioridades. Através deles é possível julgar se um pedido é atraente ou não, se uma ideia para um novo produto é potencial ou marginal, se um investimento faz ou não sentido. Os valores são importantes porque permitem que qualquer funcionário atue de forma coerente com o restante da organização e vincule sua ação à estratégia.
À medida que as empresas crescem, elas perdem a capacidade de entrar nos pequenos mercados emergentes, que serão os grandes mercados de amanhã e da inovação disruptiva. Essa deficiência não se deve apenas a uma mudança nos recursos dentro das empresas, mas também através da evolução dos seus valores.
Com o tempo, o foco de uma organização evolui entre cada fator citado acima: sua capacidade reside inicialmente em seus recursos, depois migra para processos e, finalmente, para valores. A constatação de que as organizações evoluem por meio desses três estágios foi feita por Clayton Christensen, especialista em inovação, que foi professor na Harvard Business School.
Contanto que o contexto corresponda às situações para as quais os processos foram projetados e que os valores da organização possam direcionar o negócio, a empresa terá um bom desempenho. A questão é que, como esses fatores também definem o que uma organização não é capaz de realizar, surge uma dificuldade quando o ambiente muda.
Inovação Disruptiva vs Incremental
A inovação disruptiva refere-se a um produto, serviço ou conceito que perturba um mercado existente, ou cria um segmento de mercado completamente novo. Ela acontece quando os vetores de valor tradicionais em um mercado existente são alterados de forma significativa.
Quando a inovação disruptiva entra no mercado, inicialmente atende apenas a um segmento de clientes pequeno e normalmente menos lucrativo, tornando-se inconsistente em relação aos valores defendidos pelas grandes corporações.
As grandes empresas geralmente se concentram nas inovações incrementais, que melhoram o desempenho de um produto ou serviço em aspectos que clientes de mercados convencionais já valorizam. O investimento em inovação sustentável (incremental) está sempre alinhado com os valores das empresas, pois através dela é possível obter maiores margens de lucro.
Uma das razões pelas quais construir inovações disruptivas é um desafio para grandes organizações deve-se ao fato dessas empresas dependerem de clientes e investidores para obter recursos. A criação de inovações disruptivas envolve riscos maiores e as empresas estabelecidas não têm necessariamente um plano para o fracasso. Elas não estão acostumadas a considerar seus esforços de comercialização de uma tecnologia disruptiva como oportunidades de aprendizado.
Como as grandes empresas conseguem enfrentar as mudanças?
Apesar de ser importante para o crescimento de qualquer negócio, implementar mudanças não é nada simples, e representa grandes impactos nos colaboradores – principalmente quando envolvem alteração de processos e valores. De acordo com Christensen, as novas capacidades podem ser desenvolvidas através de três maneiras distintas:
1) Desenvolvendo capacidades internamente
Uma saída para que a inovação disruptiva não esbarre em processos e valores pouco flexíveis, é criar um espaço organizacional “seguro”, que não iniba a criatividade e estimule mudanças – um grupo de trabalho isento de certas exigências corporativas.
Os processos tradicionais são extremamente valiosos para manter a saúde dos negócios principais, mas não são capazes de transformar ideias em planos de negócios disruptivos. Por isso, as empresas precisam criar processos diferentes para avaliar e moldar ideias que rompem com o tradicional. Essa experiência irá ajudar a equipe a desenvolver uma intuição coletiva sobre como moldar planos de negócios disruptivos.
Além disso, ao criar um plano agregado, as empresas podem evitar que as propostas de inovações incrementais concorram com ideias disruptivas por budget.
2) Internalizando capacidades através de uma subsidiária
Quando uma inovação demanda que a empresa crie uma estrutura de custos diferente para ser competitiva, ou quando o tamanho da oportunidade não é significante diante da necessidade de crescimento da organização principal, spin-outs podem representar uma saída interessante para a construção de novos valores para explorar a mudança.
As iniciativas subsidiárias são atividades pró-ativas, autônomas e de risco, que se originam fora da corporação central. Essas iniciativas, orientadas para o valor são tomadas a fim de avançar e evoluir com novos negócios. Isso leva a uma maior autonomia da subsidiária, resultando em controle sobre o desenvolvimento de novos produtos, processos, penetração em novos mercados ou simplesmente a geração de novas ideias que têm aplicações para outras partes da organização principal.
3) Internalizando capacidades através de aquisições
Em muitos casos, uma fonte de inovação é a aquisição de start ups (ou empresas de médio porte) que possuem os recursos e competências essenciais para alavancar as grandes empresas em novos mercados.
No entanto, é necessário que as corporações saibam explorar as competências adquiridas de maneira a extrair todo o potencial. Se as competências estão nos processos e valores da empresa que foi adquirida, a última coisa a ser feita é integrar a aquisição à organização controladora. Se por outro lado, os recursos da empresa foram a razão principal para a aquisição, então integrar a empresa à controladora pode fazer todo sentido – essencialmente conectar as pessoas, produtos, tecnologia e clientes adquiridos aos processos da organização principal como uma forma de aproveitar as capacidades existentes.
Por fim, entendemos que disrupção significa romper com o curso normal de um processo; implica repensá-lo, reconfigurá-lo, fazer diferente do habitual. A chave para a inovação disruptiva é a capacidade de repensar o modelo operacional existente e criar as condições certas para o surgimento de um novo. O primeiro passo para encontrar um caminho é compreender o problema, as capacidades e as deficiências que estão entranhadas na organização.
[avatar user=”marcelo reis” size=”thumbnail” align=”left” link=”file”]Marcelo Reis foi consultor de inovação na Inventta.[/avatar]