Afinal, o que é Estratégia Emergente
Henry Mintzberg é conhecido por ter escrito o clássico livro “Safari de Estratégia”, que nos leva, segundo o próprio autor, a um “Roteiro pela Selva do Planejamento Estratégico”. No livro, são caracterizadas 10 escolas do Planejamento Estratégico, cada uma olhando o exercício da Estratégia sob uma ótica distinta.Uma delas, a Escola do Aprendizado, explora o conceito da Estratégia Emergente, que descreve organizações que reajustam constantemente seu direcionamento através de um processo contínuo de avaliação do contexto, com reação rápida.
Esse conceito se opõe ao da Estratégia Deliberada, que descreve organizações que buscam um planejamento de longo prazo a partir de uma visão de futuro bem estabelecida.
Uma série de organizações obtiveram sucesso em seus segmentos aplicando o conceito da Estratégia Emergente.
A Zara é um exemplo: sua operação é repleta de mecanismos práticos de avaliação e reação rápida. Por exemplo, seus lançamentos são em geral realizados como “pilotos” e, após mensurar o nível de demandas sobre as novas peças, reage rapidamente aumentando a produção dos itens mais buscados pelos consumidores.
Organizações que exploram essa estratégia possuem como diferencial competitivo a capacidade de rápida adaptação frente aos aprendizados no dia-a-dia da operação.
Quando e como adotar a Estratégia Emergente?
Se por muito tempo a Estratégia Emergente permitiu um nível de adaptação satisfatório para as organizações que a aplicam, a grande intensidade das mudanças nos mercados e cadeias de valor atual está colocando um desafio sobre essa estratégia, já que o aprendizado rápido é em geral restrito apenas ao core business, não sendo mais suficiente para garantir a sustentabilidade dos negócios nesse contexto.
Com efeito, a busca e execução de oportunidades nas adjacências, indo além do core business, se tornou uma competência-chave para as organizações se manterem vivas nos últimos anos.
Nesse contexto, o seguimento estrito à Estratégia Emergente pura pode trazer um fator de risco estratégico às organizações que a seguem, pois gera em seus líderes uma sensação de tranquilidade ao ver a adaptação contínua e veloz do seu core business, porém sem garantir a devida exploração de oportunidades nos Horizontes 2 e 3. Uma miopia estratégica, dado o contexto atual de intensas mudanças.
Estratégia Emergente como forma de aprendizado
Faz-se necessária, assim, uma expansão do conceito de Estratégia Emergente de forma que o aprendizado estratégico proporcionado se aplique também às oportunidades que vão além do core business.
Dessa forma, o ponto é que as empresas em geral possuem dificuldade na exploração desses territórios mais distantes de seu dia-a-dia. Se os fatores-chave de sucesso da aplicação do conceito clássico de Estratégia Emergente restrito ao core business são a flexibilidade e autonomia na operação, que viabilizam as reações rápidas, tais fatores por si só não são suficientes para garantir o aprendizado nas adjacências. Como tangibilizar então a conceito da Estratégia Emergente para além do core? Qual o novo fator-chave de sucesso para o aprendizado estratégico?
Essa definitivamente não é uma pergunta simples.
Porém temos visto casos de organizações garantindo esse aprendizado expandido através de uma estratégia e execução da inovação bem calibradas, explorando os Horizontes 1, 2 e 3 de forma balanceada. Essas empresas estão aplicando o mindset de experimentação, porém não no modelo em geral utilizado, voltado para testes de ideias, mas sim testando territórios de oportunidade.
Navegando para o Futuro: Investimentos Além do Lucro Imediato
A mudança pode parecer sutil, mas é gigante. Imaginem: investimentos em adjacências em geral são temas de muita discussão interna antes de acontecerem.
Há uma grande diferença entre uma empresa que faz uma aposta em uma oportunidade na sua adjacência com o viés de explorar rapidamente seu potencial de retorno e uma outra empresa que faz um investimento similar não com a ambição de explorar apenas seu potencial de retorno, mas sim de aprender na prática sobre o território explorado.
Trata-se de lançar navios em direção a novos territórios de oportunidade, não apenas com a expectativa do navio voltar com bens valiosos, mas sim dele trazer a visão de como é o mapa daquele território para permitir o envio de dezenas de outros navios para lá de forma assertiva. O retorno vai além do valor presente, é o potencial de geração de valor futuro, é o aprendizado e a visão sobre possíveis novas ondas de desenvolvimento da empresa.
Territórios Estratégicos: A Vantagem da Estratégia Emergente na Identificação Precisa de Oportunidades e Economia de Recursos
Se o mecanismo de experimentação traz a vantagem de antecipar erros e assim acelerar o entendimento de que determinada ideia não é viável, e evitar grandes investimentos nela. Aplicado a nível de território, permite identificar o real nível de atratividade de territórios futuros para a organização.
Isso possibilita uma maior assertividade no seu direcionamento estratégico e evita gastos que vão muito além daqueles de exploração de ideias errôneas.
Na prática, percebe-se que organizações que estão utilizando esse novo conceito de Estratégia Emergente estão deixando parte da sua estratégia “aberta” para esse aprendizado no “além mar”, obtido através de esforços de inovação.
Quando, por exemplo, a Bosch mundialmente começa a explorar novas oportunidades no agronegócio através de intrastartups, ela está lançando navios para o território Agro para entender sua atratividade ao grupo através de evidências concretas (e não achismos).
Ela deixa um “espaço aberto” na sua estratégia para alocar essa exploração. Se confirmado o potencial do território, o próprio território pode ganhar acesso à estratégia da Bosch. Caso não, o espaço fica disponível para outros territórios, em exploração simultânea. A partir da identificação de possibilidades concretas nos territórios explorados, aumenta-se o investimento estratégico neles.
Vantagens da Estratégia Emergente
Assim, pode-se levantar algumas vantagens de se ter uma Estratégia Emergente expandida. Isso engloba o aprendizado nos Horizontes 2 e 3 através de um bom direcionamento dos esforços de inovação.
- Redução do risco de ver seu território exaurir seu potencial sem ter outros novos territórios em vista para exploração;
- Redução do risco de gastar grandes quantias em territórios de baixo potencial;
- Método relativamente barato e leve para exploração de adjacências (comparado com modos convencionais, como M&A);
- Enriquecimento da cultura organizacional com viés de inovação e empreendedorismo;
- Maior nível estratégico para os esforços de inovação, aumentando as chances de grandes retornos no longo prazo;
O tema aguça nossa curiosidade por mais casos concretos desse tipo movimento estratégico e nos traz mais questões do que respostas. Você conhece algum caso interessante de organização que está vivendo esse contexto? Compartilha nos comentários para discutirmos.
Para quem quiser ir além no tema, seguem dicas de leitura:
– Artigo da Inventta “Agilidade Estratégica” (link) → evidencia como o conceito de Horizontes não pode mais estar atrelado ao tempo de exploração a partir do surgimento de tecnologias e métodos que permitem uma experimentação estratégica ágil, como os discutidos nesse artigo de hoje.
– Artigo da Inventta “De Design Thinking para Design Thinking AND DOING!“ (link) → Traz como exemplo o case da Jundu, que explorou novos territórios para além do core business em busca de negócios adjacentes de maior valor agregado.
– Livro “Zone to Win: Organizing to Compete in an Age of Disruption” (link) → expõe um método concreto que tangibiliza o conceito discutido acima de teste de territórios adjacentes, que podem se tornar o território principal da organização no futuro.